segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

TRASTORNO DO HUMOR BIPOLAR EM CRIANÇAS - UM DESAFIO


Até alguns anos, não se falava em crianças mentalmente perturbadas. Durante toda a minha Faculdade - UFF, onde me graduei em Pediatria, eu não me lembro de ter ouvido falar nesses temas. Trabalhei no Hospital Ismélia da Silveira, em Caxias, onde a gente via de tudo - de tudo mesmo! Mas eu também não me lembro de ter atendido criança deprimida ou ansiosa ou qualquer coisa que o valha... e tampouco na pós em pediatria que eu fiz na PUC-RJ, ... quinze anos depois, fazendo a minha pós em Psiquiatria na UERJ e trabalhando em vários hospitais e clínicas psiquiátricas, aí sim, eu vi e atendi e acompanho até hoje inúmeros pacientes portadores de Transtorno do humor bipolar e outros transtornos do humor. Mas foi somente no ano passado que eu realmente "mergulhei" no universo - não raro - violento e sombrio, que muitas vezes é, o mundo dos transtornos mentais infantis... foi muito bom pra mim ter feito a pós em psiquiatria infantil na Santa Casa. Da Pediatria à Psiquiatria de adultos e daí à Psiquiatria infanto-juvenil, foi, pra mim, uma conquista de grande valor para a minha experiência profissional. Mas não posso negar que me assustei logo que comecei a atender crianças tão novinhas, apresentando comportamentos desafiadores, disruptivos, agressivos e até mesmo violentos e perigosos. Também não posso deixar de me solidarizar com mães e pais tão sofridos, que chegam à nós, tão exaustos, perdidos e sem chão, jogando suas últimas fichas naquele tratamento, frequentemente após já ter percorrido dezenas de profissionais... A responsabilidade do psiquiatra infantil é IMENSA!!! Temos que estudar muito o desenvolvimenteo da criança normal, senão a gente corre o risco de fazer diagnósicos precipitados, intuitivos ou coisa assim. Precisamos, nós, psiquiatras infantis, mais do que nunca, termos os pés no chão. Se um transtorno mental já é tão pesado para um adulto, que dirá para uma criancinha... Entretanto, transtornos mentais em crianças tão pequenas existem e nós precisamos estar atentos, pois elas podem aparecer diante de nós, e se for este o caso, não dá pra deixar passar uma criança sem que seja feito um diagnóstico correto. Pois quanto mais cedo forem as intervenções corretas, mais chances terão essas crianças de levarem uma vida digna e produtiva, como tudo mundo. A infância é uma época estratégica da vida do ser humano. É quando se dá um grande desenvolvimento físico, psicológico e mental, concomitantemente ao aprendizado básico indispensável a todos os que se seguirão pela vida. É muito importante observarmos o comportamento da criança, suas aquisições intelectivas, ouvir os pais, professores, babás, a própria criança, etc. E quando falamos de tratar uma criança, a regra é a necessidade do psiquiatra infantil ter boas parcerias, pois é muito difícil um profissional sozinho dar conta do tratamento de uma criancinha... Muitos casos têm uma demanda para psicoterapia, avaliações com fono, otorrinos, oftamos, psicopedagogos, neuros, testagens neuropsicológicas, terapia de família, etc. Pois é, fica um tratamento caro e duradouro. Como eu vinha falando, até alguns anos atrás, poucas eram as doenças mentais reconhecíveis na infância. Gradualmente, com o passar dos anos e com o avanço das pesquisas e o incremento de estudos científicos, os diagnósticos de vários transtornos psiquiátricos em crianças e adolescentes tornaram-se possíveis. Aparentemente, os casos se multiplicaram numericamente e se fizeram mais conhecidos pela população em geral. Mas ainda assim, a resistência é muito grande se trata da aceitação de certos transtornos pelos familiares, mesmo quando o transtorno é sabidamente uma condição grave, quando evolui sem um tratamento correto. O TDAH ou Transtorno do Déficit da Atenção e hiperatividade é um exemplo. "Como que eu vou dar um remédio de tarja preta para o meu filho?, ele pode ficar viciado e dependente..., ele é tão novo ainda..." Pois é, a gente que tem filho entende, basta se colocar no lugar do outro. Mas quando a situação não deixa escolha, "pena é pra galinha, e não trata nada!" O jeito é fazermos um vínculo forte e de confiança com a família, dar a essa família todo o suporte e as orientações e informações possíveis e iniciar o tratamento tão logo quanto possível - claro, depois de ter passado por todas as inúmeras etapas necessárias para um diagnóstico com responsabilidade e conhecimento. O caso dos Transtornos de Humor e o Transtorno Bipolar em crianças também são condições dramáticas em muitas das vezes. Requer prudência, conhecimento de medicina, de desenvolvimento normal e patológico, de farmacologia e de um monte de outras coisas. É muito importante o trabalho em equipe e informar a família sobre o transtorno em questão, etc. O TDAH e o Transtorno do Humor Bipolar (THB) têm sido objeto de muitos estudos e pesquisas em vários países, pois ocasionam forte impacto sobre a vida escolar, pessoal, familiar e mais tarde profissional do paciente, especialmente quando não devidamente diagnosticados. Os prejuízos decorrentes da falta de diagnóstico e do acompanhamento médico vão do fracasso escolar à evasão, da baixa auto-estima à depressão, da rejeição do grupo ao isolamento, às drogas, à gravidez precoce, à promiscuidade sexual e marginalização, suicídio, entre outras. Infelizmente, a especulação por parte de alguns profissionais não credenciados para tal avaliação, ou ainda, diagnóstico feito por pessoas leigas, tem trazido mais problemas aos que já sofrem com esse transtorno. Generalizou-se, irresponsavelmente, por exemplo, chamar de TDAH a toda e qualquer manifestação de inquietação, distração ou falta de limite que as crianças e jovens apresentem na escola ou em casa. Como conseqüência, casos em que o transtorno não existe de fato aparecem em toda parte, banalizando um problema sério e de grande repercussão sobre a vida dos pacientes portadores e sua família. Estes falsos diagnósticos são geralmente feitos à base de “achismos” como o preenchimento de questionários ou testes sem qualquer base científica ou mesmo ao sabor das conveniências pessoais de alguns adultos, que pensam dela tirar proveito, seja para justificar uma educação deficiente em limites, normas e atenção à criança ou, ainda, a outros interesses particulares.O Transtorno de Humor Bipolar em crianças é outro exemplo de doença psiquiátrica que exige seriedade no encaminhamento, pois, nessa faixa etária, a sua sintomatologia se apresenta de forma atípica. Ao invés da euforia seguida da depressão dos adultos, nas crianças surge a agressividade gratuita seguida de períodos de depressão. Nestas, o curso do Transtorno é mais crônico do que episódico e sintomas mistos de depressão seguida de “tempestades afetivas”, são comuns. Além disso, a mudança é rápida e pode acontecer várias vezes dentro de um mesmo dia, como por exemplo: alterações bruscas de humor (de muito contente a muito irritado ou agressivo); notável troca dos seus padrões usuais de sono ou apetite; excesso de energia seguida de grande fadiga e falta de concentração. Esses são alguns sintomas que devem ser observados. Os diagnósticos de transtornos da saúde mental são difíceis mesmo para os especialistas, pois é alta a prevalência de comorbidades, ou seja, o aparecimento de dois transtornos simultaneamente, o que exige conhecimento, experiência e observação minuciosa do profissional. É importante salientar ainda que estes transtornos afetam seriamente o desenvolvimento e o crescimento emocional dos pacientes, sendo associados a dificuldades escolares, comportamento de alto risco (como promiscuidade sexual e abuso de substâncias), dificuldades nas relações interpessoais, tentativas de suicídio, problemas legais, múltiplas hospitalizações, etc. Os diagnósticos devem sempre ser realizados por médicos eapecializados em transtornos da infância e adolescência, que ao diagnosticarem e acompanharem a criança, se preocupam em dar também orientações à família e à escola.Minimizar esses transtornos só piora suas conseqüências e prejudica o paciente. Somente especialistas podem afastar e esclarecer as dúvidas e não é exagero ser cuidadoso quando se trata da vida, saúde e futuro das nossas crianças!

2 comentários:

Unknown disse...

Oi Drª Evelyn Anjo
Sou eu Luzia, fiz parte da Terapia dos gansos q pra mim está sendo de grande valia até hj, lá aprendi muita coisa, sei q o mínimo, mas de grande importância pra mim nos dias de hj.
Primeiramente parabéns pelo seu blog, muito explicativo e o q é melhor, de forma clara, é isso q a população está precisando, de profissionais q falem uma línguagem mais aberta à população leiga, eu gosto muito de saber sobre todo tipo de assunto relacionado a emoção, mente,os medos, as ansiedades, enfim, seu blog tem me ajudado muito, Adorei o video, assisti com minha irmã, q tem um filho portador de TDAH e toma remédios e faz acompanhamento desde muito novinho, hj ele tem 11 anos e parece q o problema só piora, mas vamos seguindo e buscando saber cada vez mais sobre esse transtorno que afeta dois dos 11 sobrinhos q tenho.

Bjs e prossiga com seu trabalho na internet, pois saiba q ajuda muita gente.

Unknown disse...

Oi,Luzia, quanto tempo, estou com saudades de vc e da Terapia dos Gansos também, pois pra mim, foi muito gratificante!
Luzia, uma vez por mes, eu coordeno um grupo de TDAH para amigos, pais e portadores e é gratuito! Vc e a sua irmã deveriam assistir a um encontro, falar sobre o que está ocorrendo e ouvir o que as outras pessoas tem a dizer. O TDAH melhora com a idade. Alguma coisa está ocorrendo, por isso seria importante vcs assistirem a um encontro. Pode ser que o seu sobrinho esteja apresentando uma comorbidade ou entao um transtorno do humor, bipolar, enfim, fico aguardando vcs para o próximo grupo!! eu aviso!! bjssss
evelyn vinocur